segunda-feira, 21 de março de 2011

Administrar o próprio sonho faz toda diferença

Ninguém poderá conduzir o outro;
cada um deve protagonizar seu próprio destino
Esta é uma história verídica de empreendedorismo, de alguém que nunca renunciou ser o protagonista de seu próprio destino e que com sua ação influenciava positivamente quem marchasse a seu lado:

Tenho um amigo a quem, aqui, para preservar-lhe a intimidade, chamarei “Cícero”. Exemplar pai de família, diga-se antes! Mas, além, foi dos mais expoentes mestres em sua especialidade na Universidade de Brasília. Amado pelos alunos e colegas, por muitas vezes liderou os companheiros na escola e no trabalho, inclusive como empreendedor de negócios. Nunca temeu o incerto.

exímio cozinheiro e professava esse talento
Além de professor talentoso, Cícero é exímio cozinheiro e demonstra isto, principalmente, na forma de massas e outras especialidades da mesa italiana. Seus méritos de chef de cousine eram tantos e tão apreciados que, a certo momento, somado ao espírito empresário, logo seu hobby se tornara nova e promissora fonte de renda. A garagem e alguns cômodos de sua casa haviam se transformado em pouco tempo numa agitada fábrica de comida pré-congelada e outras especialidades como biscoitos e pão de queijo. Tudo era feito com esmero e refinamento. Esse sucesso de público encorajara meu amigo a profissionalizar mais o negócio e ampliá-lo. Adquiriu um lote industrial e começou a executar seu projeto de transformar o hobby numa cornucópia de prazer e receita.

Cícero, embora conhecedor das técnicas, artes e ofícios, do espírito inquieto e das múltiplas habilidades, naquele momento estava atarefadíssimo com compromissos assumidos anteriormente e com sua cátedra. Por isto resolveu confiar-me o projeto e a construção da fábrica de alimentos. Em pouco tempo estávamos com o alvará de construção nas mãos e com as obras em frenético ritmo com a finalidade de fazer do sonho de Cícero uma realidade em tempo recorde.

A descrição do cenário a seguir é essencial para expressar uma das muitas lições que aprendi durante o verão de minha vida, inclusive com meu querido amigo Cícero. Importa lembrar que naquele tempo de inflação galopante , era comum alterações de estratégias de compra ou de condução de um processo construtivo, devida à variação das cotações financeiras e as taxas de aplicação. As formas de pagamento, na prática, podiam significar alterações significativas de preços e, consequentemente, mudanças bruscas de procedimentos.

não parecia, em nada, com a ferramenta
útil e corriqueira de agora
Na época, o telefone celular não parecia, em nada, com a ferramenta útil e corriqueira de agora. Era minha rotina percorrer obras pela manhã, bem cedo; dar encaminhamentos, fazer previsões e comunicá-las à central de compras com vistas às necessidades futuras, tanto de insumos quanto de mão-de-obra. Mal chegava  à obra da fábrica, recebia uma ligação pelo telefone fixo no escritório do canteiro: era sistematicamente o Cícero. Sua saudação matinal soava sempre peculiar e animadora e sua comunicação muito curta e objetiva: “Oi, como vai? Estou ligando para saber se você precisa de alguma coisa especial hoje”. Aí, conversávamos um pouquinho.

Eu passava no escritório de minha empresa, para atender aos despachos administrativos, somente depois do almoço, após percorrer também os bancos. Naqueles tempos o movimento bancário ainda requeria a presença física dos clientes para as mais simples operações que hoje são realizadas por meio eletrônico. Havia o agravante do ritmo inflacionário de então, que obrigava as pessoas a manterem os ativos muito bem assistidos, para não serem completamente liquidados pela desvalorização monetária. Finda a exaustiva trilha entre canteiros de obras e filas de bancos eu ia finalmente cumprir o expediente burocrático do escritório da firma, faina que se estendia à noite. Ao chegar da rua antes ou pouco depois de sentar-me à mesa ou à prancheta, o telefone tocava. Era invariavelmente o Cícero. Sua saudação era a mesma expressão de simpatia, reveladora de sua onipresença, algo assim: “Oi, como vai? O gerente me disse que você já esteve no banco e que está tudo bem. Eu só estou ligando para saber se você precisa de alguma coisa especial, além das previsões”.

Não aprendi com ele, como bem poderia,
lições de engenharia ou de arquitetura
Cícero nunca havia sido meu professor durante os anos que passei na Universidade. Esse privilégio que tive fora transferido para o tempo em convivi com ele noutras circunstâncias de ações políticas, corporativas e a partir da construção de sua fábrica de alimentos. Não aprendi com ele, como bem poderia, lições de engenharia ou de arquitetura. Nem mesmo, sequer, retive na memória uma de suas maravilhosas receitas da cozinha italiana. Meu aprendizado com Cícero foi muito mais valioso, foi sobre a formalização da postura estratégica de quem deseja ver realizada uma idéia cuja concretização depende também da ação de terceiros: o controle sistemático, comprometido e positivo. Esta foi uma grande lição que Cícero me deu, demonstrada não diretamente pelo que falava mas, antes, pela ação de interagir comigo. Ele estava atento e amplamente interessado em colaborar na concretização de seu sonho, sem surpresas ou esforços desperdiçados. Ele me comunicava estar presente no processo, pró-ativo e sinérgico em relação ao que planejara.

atenção ao sonho e protagonismo
quanto ao próprio destino
Embora eu tivesse me entregado a gerência do processo, Cícero sempre me sinalizava claramente que era ele o líder, e isto era importante para manter seu interesse na prioridade de meus afazeres.

Testemunho quase todos os dias jovens estudantes abandonando seus sonhos nas mãos de professores e colegas, deixando somente por conta destes a condução de seus cursos rumo à graduação como arquitetos e urbanistas. Gostaria que fosse diferente, que os alunos fossem mais exigentes, que dissessem "presente!" além do momento de responder à chamada, que fossem mais parecidos com meu amigo Cícero, a quem recordo invariavelmente como exemplo de atenção ao sonho e protagonismo quanto ao próprio destino.



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