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Ninguém poderá conduzir o outro; cada um deve protagonizar seu próprio destino |
Esta é uma história verídica de empreendedorismo, de alguém que nunca renunciou ser o protagonista de seu próprio destino e que com sua ação influenciava positivamente quem marchasse a seu lado:
Tenho um amigo a quem, aqui, para preservar-lhe a intimidade, chamarei “Cícero”. Exemplar pai de família, diga-se antes! Mas, além, foi dos mais expoentes mestres em sua especialidade na Universidade de Brasília. Amado pelos alunos e colegas, por muitas vezes liderou os companheiros na escola e no trabalho, inclusive como empreendedor de negócios. Nunca temeu o incerto.
Além de professor talentoso, Cícero é exímio cozinheiro e demonstra isto, principalmente, na forma de massas e outras especialidades da mesa italiana. Seus méritos de chef de cousine eram tantos e tão apreciados que, a certo momento, somado ao espírito empresário, logo seu hobby se tornara nova e promissora fonte de renda. A garagem e alguns cômodos de sua casa haviam se transformado em pouco tempo numa agitada fábrica de comida pré-congelada e outras especialidades como biscoitos e pão de queijo. Tudo era feito com esmero e refinamento. Esse sucesso de público encorajara meu amigo a profissionalizar mais o negócio e ampliá-lo. Adquiriu um lote industrial e começou a executar seu projeto de transformar o hobby numa cornucópia de prazer e receita.
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exímio cozinheiro e professava esse talento |
Cícero, embora conhecedor das técnicas, artes e ofícios, do espírito inquieto e das múltiplas habilidades, naquele momento estava atarefadíssimo com compromissos assumidos anteriormente e com sua cátedra. Por isto resolveu confiar-me o projeto e a construção da fábrica de alimentos. Em pouco tempo estávamos com o alvará de construção nas mãos e com as obras em frenético ritmo com a finalidade de fazer do sonho de Cícero uma realidade em tempo recorde.
A descrição do cenário a seguir é essencial para expressar uma das muitas lições que aprendi durante o verão de minha vida, inclusive com meu querido amigo Cícero. Importa lembrar que naquele tempo de inflação galopante , era comum alterações de estratégias de compra ou de condução de um processo construtivo, devida à variação das cotações financeiras e as taxas de aplicação. As formas de pagamento, na prática, podiam significar alterações significativas de preços e, consequentemente, mudanças bruscas de procedimentos.
Na época, o telefone celular não parecia, em nada, com a ferramenta útil e corriqueira de agora. Era minha rotina percorrer obras pela manhã, bem cedo; dar encaminhamentos, fazer previsões e comunicá-las à central de compras com vistas às necessidades futuras, tanto de insumos quanto de mão-de-obra. Mal chegava à obra da fábrica, recebia uma ligação pelo telefone fixo no escritório do canteiro: era sistematicamente o Cícero. Sua saudação matinal soava sempre peculiar e animadora e sua comunicação muito curta e objetiva: “Oi, como vai? Estou ligando para saber se você precisa de alguma coisa especial hoje”. Aí, conversávamos um pouquinho.
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não parecia, em nada, com a ferramenta útil e corriqueira de agora |
Eu passava no escritório de minha empresa, para atender aos despachos administrativos, somente depois do almoço, após percorrer também os bancos. Naqueles tempos o movimento bancário ainda requeria a presença física dos clientes para as mais simples operações que hoje são realizadas por meio eletrônico. Havia o agravante do ritmo inflacionário de então, que obrigava as pessoas a manterem os ativos muito bem assistidos, para não serem completamente liquidados pela desvalorização monetária. Finda a exaustiva trilha entre canteiros de obras e filas de bancos eu ia finalmente cumprir o expediente burocrático do escritório da firma, faina que se estendia à noite. Ao chegar da rua antes ou pouco depois de sentar-me à mesa ou à prancheta, o telefone tocava. Era invariavelmente o Cícero. Sua saudação era a mesma expressão de simpatia, reveladora de sua onipresença, algo assim: “Oi, como vai? O gerente me disse que você já esteve no banco e que está tudo bem. Eu só estou ligando para saber se você precisa de alguma coisa especial, além das previsões”.
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Não aprendi com ele, como bem poderia, lições de engenharia ou de arquitetura |
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atenção ao sonho e protagonismo quanto ao próprio destino |
Testemunho quase todos os dias jovens estudantes abandonando seus sonhos nas mãos de professores e colegas, deixando somente por conta destes a condução de seus cursos rumo à graduação como arquitetos e urbanistas. Gostaria que fosse diferente, que os alunos fossem mais exigentes, que dissessem "presente!" além do momento de responder à chamada, que fossem mais parecidos com meu amigo Cícero, a quem recordo invariavelmente como exemplo de atenção ao sonho e protagonismo quanto ao próprio destino.
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